Novelas e audiências: as causas da mudança
É capaz de ser por aqui - sem querer ofender ninguém. Tenho ficado surpresa ao longo do tempo com o chamado feed-back da recepção das novelas pelo público. Uma das coisas que constato (e já aqui falei disso) é que o que lá faz um estrondoso sucesso, ás vezes aqui é mediano e o que lá é fracasso é o que aqui mais gosto de ver. Mas tudo está a mudar.
Em ambos os países é dito que as audiências de Ciranda de Pedra são as menores de sempre. A novela tem qualidade. Então, o que está mal?
Se calhar, é o público que mudou. Aquele que aprecia um certo nível de qualidade ficou em minoria. Não me levem a mal mas novela é um veículo social de estudo demasiado interessante para deixar de fazer estas interpretações. E elas são:
Aumentou o número de público com baixa formação e escolaridade.
Num documentário sobre telenovelas brasileiras, um conhecido director afirma que antigamente a camada da população muito pobre não tinha acesso à televisão ou havia apenas um aparelho por lar. Mas isso mudou. Os aparelhos multiplicaram-se e hoje, a camada pobre e pouco formada tem acesso ás novelas tal e qual como outro cidadão qualquer. O público aumentou consideravelmente, mas não o seu nível de formação.
Esta é mais uma interessante mudança social promovida pelas novelas. Um número maior de público que gosta de enredos simples, situações clichés com as quais se possam identificar mais facilmente, do que com o glamour, sofisticação e riqueza de que estão mais distanciados. Ainda mais quando tudo isto vem «embalado» numa novela de época. A maioria não aprecia e prefere algo mais «pé no chão».
Não deixa de ser bastante triste. Porque esta nova mudança social vem a evidenciar uma realidade triste e desapontante: a falta de formação e o aumento das diferenças entre as classes. As novelas de hoje prestam-se como «medidores» desta realidade. Coisas muito ruíns são apreciadas por essa «massa» que é a audiência (Ibobe). Devia servir de alarme. Isto atinge um nervo que me é particularmente sensível. A EDUCAÇÃO. Como alguém que acredita que só a educação pode conduzir a humanidade a um mundo melhor, este novo «fenómeno» social do qual as novelas são um termómetro, vem a revelar uma realidade feia.
Antigamente as novelas eram consideradas um produto menor e sofriam desse preconceito. A maioria das pessoas não admitiam ver e gozavam com quem disesse que via. Dava-se demasiada importância à mediocridade alheia! Aí Portugal abriu-se à produção, a novos canais televisivos e, aos poucos, a população sentiu que não havia mais problemas em admitir que gosta de ver novelas, tanto ou mais que o «intelectualmente aceitável» Telejornal.
Foram dois fenómenos sociais distintos. Estamos a atravessar mais um. A novela é um produto que agrada as massas e todos têm acesso a ela. O problema é que a maioria do povo deste planeta vive mal ou na miséria. Não tem muita instrução. Aumenta a criminalidade, a violência, nas escolas os alunos não mais têm respeito pelos professores que são violentamente agredidos e em casa os país se demitem do papel de educadores. Todos os males da sociedade têm repercursão nas novelas. No chamado «Ibobe». Ou seja: as audiências.